Segue um trecho da matéria realizada pelo jornal O São Paulo, 29 de Junho de 2019, por Nayá Fernandes, à respeito do Corpo na Arte, com artistas com deficiência e, nossa intérprete Shirlei Caetano, do grupo DiDanDa, participação especial de Daniella Forchetti. A matéria completa pode ser conferida pelo site:
"A dança, o teatro e as demais manifestações artísticas, sobretudo aquelas que evidenciam o corpo, são, na maioria das vezes, consideradas inapropriadas para pessoas com alguma deficiência que, aparentemente, as impede de expressarem-se artisticamente. Na maioria das vezes, a atividade é vista mais do ponto de vista terapêutico do que da capacidade artística da pessoa com deficiência.
A dificuldade é vivenciada por muitos artistas, como, por exemplo, Arthur Baldin, 24, formado em Comunicação das Artes do Corpo pela PUC-SP e mestrando pela mesma Universidade. Arthur está realizando uma pesquisa sobre o corpo debilitado no espaço cênico e prepara um monólogo na qual conta e ri da própria história.
Arthur nasceu com anóxia neonatal. Durante um trabalho de parto complicado e demorado, passou por insuficiência respiratória e, além de permanecer na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), teve convulsões no pós- -parto. “Uma amiga da minha mãe sugeriu que ela me batizasse ainda lá na UTI e assim ela fez. Depois disso, eu comecei a me recuperar e no dia seguinte recebi alta do hospital”, contou Arthur, que, como sequelas, ficou com dificuldades na fala e alguns movimentos descoordenados no corpo.
Shirlei Caetano Pinto Araújo, 65, é dançarina e artista plástica. Natural de Londrina (PR), ela nasceu com a rara síndrome de Usher, doença genética que leva à perda parcial ou completa da visão e da audição. Ela escuta com a ajuda de aparelhos e tem perda total de olfato. Shirlei foi a única que teve consequências entre seis irmãos, e a síndrome se desenvolveu pelo fato de os pais de Shirlei serem primos.
“Meus pais não perceberam que eu escutava mal e só depois de muitos anos percebi que eu era uma pessoa com deficiência e tinha alguns direitos adquiridos. Trabalhei na banca de jornal do meu pai até me casar e tive com meu esposo um filho”, contou à reportagem do O SÃO PAULO.
Os médicos fizeram um procedimento cirúrgico que impediu que Shirlei tivesse outros filhos, pois, segundo eles, a gestação acelera sintomas da síndrome. “Eles fizeram a cirurgia praticamente sem o meu consentimento. Meu esposo e eu gostaríamos de ter outros filhos”, afirmou Shirlei, que é viúva e mora com o filho, Willians Pinto Araújo, 29. Há cerca de 10 anos, após recuperar-se de um câncer de mama, ela perdeu também a visão e hoje só consegue diferenciar claros e escuros.
A DANÇA
Shirlei foi, por si mesma, descobrindo como tirar o máximo da sua condição. Quando frequentou o Hospital das Clínicas, foi encaminhada para instituições especializadas, em 2002. Desde então, ela realiza atividades de padaria, esculturas em argila e dança.
“Eu sou católica e faço muitas esculturas marianas, de Nossa Senhora de Fátima, Nossa Senhora de Guadalupe e Auxiliadora, por exemplo. Gosto muito dos trabalhos manuais”, explicou Shirlei, cujas esculturas são vendidas na sede da própria instituição. A dança contemporânea ela começou há 13 anos. Hoje, participa de um grupo de dança inclusiva que faz apresentações em congressos, durante a Virada Cultural Inclusiva e em outros eventos.
“Por meio da dança, podemos criar uma ressonância, utilizando a Arte como instrumento de diálogo entre os indivíduos com e sem deficiência, possibilitando a expressão entre corpos diferentes”, afirmou em seu blog Daniella Forchetti, doutoranda pelo Instituto das Artes na Unicamp e especialista em Linguagens das Artes pela USP. Daniella é professora de Shirlei e a acompanha nos projetos e apresentações."
Fotos: Luciney Martins/O SÃO PAULO - Douglas Canjani